sábado, 12 de março de 2011

ESCREVER É MEU PROCESSO CRIATIVO...


Como arteterapeuta, me fazia constantemente uma pergunta. Pergunta esta, que mesmo antes deste meu processo de enamoramento com a arte, também já me inquietava. Não há nada, artisticamente falando, de que eu goste? Um bordado, um tricô, pintura, cozinhar... e ficava então, me fuçando na busca deste grande achado. Gosto de fazer algumas coisas sim, até mesmo cozinhar, quando de posse de uma receita não tão complexa! Gosto de fazer mandalas, mosaicos, pintar de vez em quando, fotografar, mas nada que me fizesse ocupar o meu tempo de forma considerável ou que me desse tanto prazer a ponto de passar horas a fio inebriada na atividade.

Descobri na arteterapia que arte é muito mais do que aquilo que consideramos arte. Mas por pensarmos de forma tão restrita e desconhecermos o que seja, acabamos por excluir com facilidade o que de fato se intitula arte em favor daquilo que apenas admiramos por sua beleza. Arte é um processo criativo, e como todo processo criativo ela é ampla, complexa, livre e por vezes, foge a nossa compreensão.

“Fazer arte é uma maneira de concretizar nossa necessidade de viver num âmbito mais amplo e profundo. No processo de criar, expandimos nosso psiquismo [...]” (ZINKER, 2007, p. 21).

A minha arte é a escrita. São as palavras que uso na construção e materialização de mim mesma, á a minha expressão. Ao tramá-las permito ir dando forma ao que escrevo, assim como uma modelagem ou uma pintura que vai se delineando.

Neste processo da escrita busco a mim mesma e vou tecendo a minha própria história de vida. As palavras exercem um poder grandioso, vão sendo trançadas e manipuladas, assim como os fios usados por uma tecelã. Ao escrever as minhas várias histórias sinto que vou tecendo minha teia e me construindo.

“Ao colocar no papel a sua imaginação, ao selecionar vocábulos e expressões para a sua produção, a energia que está contida no símbolo (palavra) é ativada e torna-se, já a partir daquele instante, um projeto de realidade” (VASCONCELLOS, 2007, p.113).

Então descobri porque passo horas a escrever, e este processo me fascina. É a minha arte, a arte de escrever, de ser, de viver. Escrevo, reescrevo e transcrevo.

Esta prática me exige a vida, pois é neste processo que me busco, rebusco, crio e recrio. “[...] em cada ato criativo podemos nos recriar, transformar e renovar, retramando o próprio destino” (BERNARDO, 2008, p. 23).

Escrevo pra não enlouquecer, pra registrar, pra desabafar, pra ressignificar. Escrevo o que vem a alma, o que sinto, o que penso, o que sei e o que não sei. Escrevo para aprender.

Escrever é gritar, é por para fora as minhas feras ocultas, escusas. Para dar voz ao silêncio do meu pensar, do meu sentir. Por isso escrever é terapêutico, porque me permite expressar e examinar conteúdos e dimensões de minha vida interior.

E o que era apenas uma folha de papel em branco passa ser a possibilidade para o germinar das minha ideias. Logo mexo, remexo, pesquiso, vou e volto, dispenso, mas a ideia permane na cachola, e em algum momento ela sai e se presentifica, ganha vida por meio das palavras. Assim, passo o tempo delineando a minha criação, a minha obra prima, formatando o meu pensar.

E o que vejo é meu, eu fiz, eu juntei as letrinhas, as palavras e as frases. Eu rebusquei aqui e ali nas lembranças daquilo que a vida me deu. Dou-me conta de que não quero somente trazer na lembrança aquilo que foi vivido, preciso ressignificar e transformar. Escrever me faz bem, me acalenta a alma, me nutre e me transforma. 

Escrever me faz perder o sono e aí desisto de dormir e vou escrever porque as idéias afloram... sabe pedal de bicicleta em alta velocidade e mesmo quando você resolve parar ele continua disparado sem controle!

Juliano (1999), diz que é tarefa do terapeuta olhar para os retalhos de histórias que são trazidos. Vejo-me desta forma, como minha própria terapeuta, recolhendo os pedaços das minhas histórias, compondo e recompondo, reorganizando, ensaiando novas percepções.

Formando um mosaico de mim.

“Muitas vezes, a partir de um texto, encontramos a saída para algum problema. A resposta já se encontra em nós, mas não era possível surgir com a fiscalização constante do ego. Escrever é dar oportunidade a todos os nossos anjos e demônios. É permitir que apareçam para que possamos dialogar com eles e negociar o nosso futuro” (VASCONCELLOS, 2007, p.113)

E desta forma, vou seguindo o caminho da minha individuação.



REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

- BERNARDO, P. P. A prática da arteterapia: correlações entre temas e recursos., v.I: temas centrais em arteterapia. São Paulo: Ed. do Autor, 2008.
- JULIANO, J. C. A arte de restaurar histórias: o diálogo criativo no caminho pessoal. São Paulo: Summus, 1999.
- VASCONCELLOS, M. Palavras da salvação: a importância da escrita na busca do si-mesmo. In: PHILIPPINI. A. (org).  Arteterapia – Métodos, Projetos e Processos. Rio de Janeiro: Wak, 2007.
- ZINKER, J. Processo criativo em gestalt-terapia. São paulo: Summus, 2007.

 

7 comentários:

Sarah disse...

Elen,

Que lindo lhe ver desabrochar, através das palavras. Também sou uma amante incondicional delas, carrego-as no colo, levo-as no ventre. Costumo dizer que tenho uma relação uterina com as palavras e como você bem disse: elas dizem quem somos.

Aproveito para partilhar fragmentos de livros de Clarice Lispector sobre o ato de escrever:

"Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada"

"Escrevo porque encontro nisso um prazer que não consigo traduzir. Não sou pretensiosa. Escrevo para mim, para que eu sinta a minha alma falando e cantando, às vezes chorando..."

Adoro Clarice. Seus livros me tomam por completo.

Fica com Deus e um forte abraço,
Sarah

Elenrose Paesante disse...

Querida Sarah,

Obrigada pelas lindas e carinhosas palavras! Também adoro Clarice!
Bjinhos

Bárbara Cerejo disse...

Adorei o seu blog!!! Cheio de coisas interessantes pra ler...

Bjs!

Elenrose Paesante disse...

Obrigada, Bárbara. Entre sempre que desejar! Bjos

Sara Rosa disse...

Elen,
Estou começando um curso de arteterapia, sou Pedagoga,ORIENTADORA EDUCACIONAL, ARTE EDUCADORA_HABILITAÇÃO MÚSICA,atualmente aposentada por motivo de saúde, (fibromialgia, minha história é longa, mas no momento busco minha auto cura, pois é impossível para quem tem as ferramentas terapêuticas da cura não possa fazê-se. Há um querer profundo, lendo o que escreveste a serteza se instalou em mim.pois já escrevi muito, deswenhei mandálas, compus músicas, poesias. Mas o momento talvez não me dissesse que era meu, agora vasculhando alguns escritos paro e penso fui eu que escrevi? na
ão imporat mais se é mediúnico ou não, o importante é a consciência se expandindo para esse novo, que vem me impulsionando para!!! E veja só buscando literatura me deparo com vc, coincidência? não sei, só sei que são palavras fortes que tocam na alma fazem-nos pensar e abrir-se para nossas capacidades cósmicas.
espero poder continuar em contato
Sara rosa

sara rosa disse...

Palavras são palavras que tocam, encantam, tiram de nosso interior suspiros.
é deixar fluir a mente, a alma , o ser , palpitar a vida....
se na vida conduzísemos nossas atitudes com mais palavras brotadas da alma o mundo seria mais humano
seu trabalho é lindo
que fonte criadora continue a te inspirar em tua criação
Sara Rosa

Elenrose Paesante disse...

Que bom Sara Rosa, saber que de alguma forma pude contribuir com o seu processo de ressignificação. Fico feliz! Seja sempre bem vinda!!!
Elen